A criança se forma através de relações de amor com os pais, irmãos, avós, professores, amigos, com outras crianças, com a natureza, etc...
Você alguma vez já pensou nesta pergunta? Sua família é uma ilha? É uma excelente reflexão para os pais novos. Ao longo deste artigo você vai entender a razão.
Tenho feito um trabalho de intermediadora de diálogos após sessões de exibição do filme “O começo da vida”. Tem sido uma tarefa enriquecedora e gratificante.
Para quem não conhece, este filme foi lançado em maio deste ano. É um documentário sobre a importância dos primeiros anos de vida. Filmado em 9 países, mostra famílias de diversas culturas, etnias e classes sociais, com depoimentos de crianças, mães, pais, além de entrevistas com inúmeros especialistas em desenvolvimento infantil. O filme foi produzido pela cineasta brasileira, Estela Renner. O trabalho de produção durou 3 anos. Foram 400 horas de filmagem. A diretora e sua equipe rodaram 4 continentes. O filme é belíssimo. Já assisti diversas vezes e toda vez que assisto novamente me emociono, tal a sua força , sensibilidade e delicadeza.
É uma proposta de reflexão sobre a relevância dos primeiros 6 anos de vida das crianças e o impacto deste período na formação e desenvolvimento dos potenciais que cada indivíduo poderá ser capaz de cultivar ao longo da existência. Ele nos desperta para os cuidados com a primeira infância, e reforça que as crianças são o futuro da humanidade.
Há uma passagem maravilhosa no livro “Grande Sertão Veredas“ de Guimarães Rosa que fala assim: “Uma criança nasceu. O mundo tornou a começar.” O milagre do recomeço do mundo acontece a cada novo nascimento. O mundo recomeça todas as vezes que, vencendo tantas forças contrárias, a vida sobrevive. A primeira força que a criança tem que fazer é lutar para passar pelo canal de nascimento. Esta é a 1ª jornada do herói.
Após o nascimento, a criança passa pela 2ª gestação, a gestação extra uterina e social. Ao nascer a criança é entregue às mãos humanas, num verdadeiro útero social formado pela família, pela escola e por toda a comunidade. A criança se forma através de relações de amor com os pais, irmãos, avós, professores, amigos, com outras crianças, com a natureza, etc… A infância é o chão sobre o qual cada ser humano constrói a sua vida. É um período curto, mas que tem uma potência enorme, que nos enriquece e perdura por toda a vida.
Uma entrevista que me impactou bastante no filme, foi com a médica Dra. Vera Cordeiro, fundadora da Associação Saúde Criança. Ela diz que a criança chega com tanta energia, com tanta criatividade, que a mãe só não dá conta. É necessário pai, avós, vizinhos… é necessário toda a comunidade para que a criança se desenvolva e ela cita um provérbio africano – “É necessário uma vila para educar uma criança.”
Isto me levou a refletir sobre como é árdua a jornada de educação dos filhos e como precisamos de suporte para enfrentar tantos desafios que se impõe diante de nós ao longo dos anos de formação deles.
É muito importante quando podemos contar com a presença dos avós, tios, amigos, vizinhos. É fundamental criarmos uma rede de apoio. É reconfortante saber que temos a quem recorrer em momentos difíceis. Fica mais fácil quando temos contato com outras famílias com crianças e que podemos promover encontros e interações entre elas.
As escolas que meus filhos frequentaram tiveram papel relevante sob este aspecto ao estimular o convívio entre as famílias por meio de organização de passeios, encontros fora da escola. Vivenciamos uma grande integração entre nós, o que contribuiu para o estabelecimento de vínculos mais fortes que perduram até hoje.
As dificuldades da vida nos grandes centros urbanos de certa maneira nos levaram ao isolamento. A violência crescente gerou muita insegurança e fez com que erguêssemos muros e perdêssemos o sentido comunitário. Mas para se desenvolver, a criança precisa de círculos de amizade onde possa se expandir gradualmente. Principalmente os jovens, que a partir dos 14 anos vão se separando dos pais e conhecendo o mundo. Nesse momento a rede social criada e cultivada durantes anos, poderá funcionar como uma ponte segura na transição da adolescência. Na verdade os filhos não pertencem aos pais, eles pertencem à família toda, a comunidade local e a humanidade inteira. Por isso que refletir sobre a pergunta – Sua família é uma ilha? – é extremamente importante.
Sinto profunda gratidão por toda a rede social que me ajudou na educação dos meus filhos. Sou grata aos meus pais, irmãos, sogros, amigos, pessoas sensacionais que foram verdadeiras âncoras e que doaram tempo e muito amor à eles.
Vale a pena nutrir esses relacionamentos! Vale a pena assistir o filme!
abraço carinhoso
Ana Lúcia