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INFÂNCIA HIPERDIGITALIZADA


Infância hiperdigitalizada foi assunto do programa ‘Região em Foco’ da Rádio Ondas FM97,7 (Região dos Lagos -RJ), apresentado pelo jornalista Leandro França. Fui convidada para falar sobre o excesso do mundo digital na vida das crianças depois de ter publicado um artigo sobre o aumento do tempo em frente as telas pelos pequenos.

A entrevista está no meu canal do Youtube e foi transcrita para compartilhar aqui no Educando Tudo Muda, confira:

Infância Hiperdigitalizada nas ondas do rádio

Infância hiperdigitalizadaTivemos acesso ao artigo “Infância Hiper Digitalizada” e trazer este assunto aqui na pauta do nosso programa é interessante, já que as telas invadiram de vez a vida dos pequenos. Quais as influências que essas tecnologias exercem no comportamento infantil durante a fase de formação e desenvolvimento?  Nós vivemos sob a influência de uma  revolução tecnológica há muito tempo, e   agora com a COVID 19 o mundo inteiro  se rendeu  às telas.  Fomos todos sugados para dentro dos nossos próprios mundos digitais.  As telas representam hoje educação à distância,  socialização com familiares e amigos,  entretenimento e estão sendo usadas até mesmo para consultas médicas.

Mas em relação às crianças , temos que considerar as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria que orienta que  crianças de até dois anos de idade não sejam expostas a telas e que as de até cinco anos tenham contato por menos de uma hora por dia.  Para este período de quarentena a recomendação é que aos menores de 2 anos, seja  liberado apenas para o uso afetivo, gerenciado pelos pais. O que é o uso afetivo? É aquela chamada com vídeo para ver os avós, tios e primos, amiguinhos da escola. Nas outras idades é importante combinar um tempo mínimo para isto, sempre com algum  monitoramento.  Por quê essas  orientações? E aí eu respondo a sua pergunta:

Para se constituir como um ser humano,  a criança depende do ambiente em que vive, dos estímulos que recebe e da interação e convívio com outros seres humanos.  Os primeiros anos de vida correspondem a um tempo primordial da constituição psíquica da criança, da apropriação do próprio corpo por meio dos sentidos, da relação consigo mesma, e das relações com o outro, e tudo isso depende de experiências de  vida no mundo real, de estímulos sensoriais  capazes de  afetar o corpo da criança, e que permita a ela perceber variados cheiros, sons, sabores, impressões táteis.  O mundo virtual não oferece à criança as impressões do mundo natural e a dimensão do humano em suas relações.

Os fenômenos, as manifestações de vida, os processos, não podem ser absorvidos por meio de visualizações, emojis e curtidas. A vida é apreendida pela criança, e as aprendizagens ocorrem na interação com o mundo real, nas relações de afeto, na presença, no olho no olho, no calor do toque.

 

Como os Pais devem estar atentos ao conteúdo exposto aos seus filhos? As crianças estão expostas a uma variedade de conteúdo pela internet. Os pais precisam conhecer o que os filhos estão acessando e vendo. Por trás dos Youtubers e Influencers que as crianças e adolescentes seguem, existe  um forte apelo mercadológico e consumista. Existe o perigo de conteúdos inadequados, as fakenews e ainda o risco de armadilhas de pedofilia. Os pais devem atuar como mediadores, e monitores da vida online das crianças e também negociar os limites de tempo de uso.

 

Muitos pais acabam recorrendo aos eletrônicos para entreter os filhos e conseguir dar conta das tarefas de casa. Há algum jeito de fugir desse roteiro? A linguagem dos smartphones e tablets é uma linguagem de isolamento. Há um perigo muito grande nessa ausência de mediação.  As máquinas “falam” com as crianças de maneira fria, impessoal, descontextualizada, desprovida das experiências vivenciadas dos adultos, sem a transmissão de valores culturais.

As crianças precisam ser participantes da vida da casa. Este é o momento de fazermos juntos. Incluir as crianças nas tarefas que precisam ser executadas, delegar algumas  tarefas de acordo com a faixa etária das crianças. Compartilhar de forma lúdica as atividades do dia a dia como  preparar as refeições, lavar a louça, arrumar a cama, regar as plantas, dar comida para os animais domésticos, etc. Tudo é aprendizagem, talvez até muito mais significativa e também capaz de trabalhar a autonomia e autoestima da criança.

Para fazer diferente, a partir da realidade de cada família, é importante  organizar uma rotina que respeite e contemple todos os tempos. Tempo de promoção da saúde com horas adequadas de sono, atividade física, banho de sol. Tempo para as aulas online e atividades escolares. Tempo offline para o brincar livre para as crianças menores e no caso das  mais velhas, para  atividades  em que possam expressar sua subjetividade por meio de desenhos, colagens, trabalhos manuais, jardinagem, fotografia, música.  Tempo de ócio, momentos de  não fazer nada para que permita que a criatividade floresça, e por fim tempo de convívio salutar – um jogo em família à noite, contação de histórias para os pequenos e o que mais fizer sentido de acordo com o contexto de cada família, não existe um manual, uma receita pronta.

 

É possível identificar quando o mundo virtual começa a fazer mal para alguma criança? De acordo com o Dr. Cristiano Nabuco de Abreu, psicólogo e coordenador do Grupo de Dependência Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria do  Hospital das Clínicas de São Paulo, a situação é preocupante. Ele tem atendido casos de crianças viciadas em smartphones, videogames e tablets, incapazes de se relacionar sem ser virtualmente, de manter a concentração e até mesmo dar sequência a um raciocínio lógico.  Em sua experiência clínica, tem atendido casos de crianças com pouco mais de 2 anos de idade que não comem, nem vão para a cama se não tiverem um aparelho digital ao lado.

A Dra. Julieta Jerusalinsky, psicanalista especializada em primeira infância, adverte  que estão chegando ao  consultório crianças que diante de algo da realidade que as pertubam, fazem um gesto de passar o dedo sobre uma superfície como se no movimento do touchpad, elas pudessem alterar a realidade. Estão chegando crianças  repetindo fragmentos sonoros extraídos da internet, que não fazem o menor sentido para ela mesma e para os pais, pois os dispositivos digitais  emitem sequências sonoras, mas são incapazes de sustentar uma comunicação efetiva, um diálogo com a criança. Esses são sinais dos impactos negativos do mundo virtual na vida das crianças.

Por outro lado, com as escolas fechadas, a opção dos professores é ministrar aulas online. Como as crianças devem se adaptar e se comportar para acompanhar essa nova modalidade de aprendizado?Estamos todos tateando frente ao novo. Mas é inegável que as aulas online precisam estar  atreladas a um contexto de realidade da criança e permitir que a partir dos conteúdos apresentados ela faça relações com  experiências vividas,  reais.  As crianças apreendem o mundo e aprendem por meio dos estímulos sensoriais, mediante o contato com a materialidade, com o concreto.

Qual o papel da literatura na infância neste momento de isolamento social? A literatura neste momento pode ser uma janela para o mundo exterior. Diferente dos desenhos animados e filmes, os livros não apresentam um cenário pronto ou uma paisagem fixa.  O trabalho em absorver uma história exige que a criança construa suas próprias imagens, e faça conexões para atribuir significado ao que está lendo ou ouvindo no caso de uma contação de história. Isso torna a criança  mais ativa na situação em comparação com a passividade gerada pelo olhar fixo nas telas. Diante das telas, corpo e imaginação ficam inativos,  ao passo que ao ler, ou ouvir uma história, a imaginação é despertada e capaz de percorrer mundos.

Algum registro, mensagem ou consideração final? Para finalizar quero dizer que a reconexão da infância com a natureza, é o que vai fazer o contraponto a este mundo para vez mais digital. A  relação da criança com o mundo natural  é o que vai garantir a formação de uma nova geração de guardiões da natureza e por consequência  a sustentabilidade do planeta Terra.

OBs.: a entrevista aconteceu no dia 28 de maio de 2020.

Abraço caloroso

Ana Lúcia Machado

 

CUIDADO COM O TEMPO GASTO EM FRENTE AS TELAS – CRIANÇAS NA QUARENTENA

O tempo gasto em frente as telas aumentou no mundo inteiro desde as medidas de isolamento social. Todos nós estamos sendo sugados pelos dispositivos digitais – adultos, adolescentes e até mesmo as crianças.

Com a suspensão das aulas presenciais devido à pandemia, milhões de crianças estão vivendo cotidianamente num mundo muito mais digitalizado em frente as telas dos computadores,  smartphones, tablets e também televisores.  Os dispositivos digitais transformaram-se em ferramentas para a educação à distância, meio de socialização com familiares e amigos, e entretenimento.

em frente as telas

As telas invadiram de vez a vida dos pequenos. Entretanto a  exposição excessiva aos aparelhos tecnológicos pelas crianças deve  ser evitada, como recomendam os especialistas.

Como  lidar com os desafios do mundo ainda mais digital? Quais os efeitos  do excesso tecnológico para a saúde física e psíquica das crianças? Quais as influências que essas tecnologias exercem no comportamento infantil durante a fase de formação e desenvolvimento? Há muito mais perguntas do que respostas neste momento, mas existem alguns norteadores para nos auxiliar nesta travessia.

O que precisamos refletir para proteger as crianças?

A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria é que crianças de até dois anos de idade não sejam expostas a telas e que as de até cinco tenham contato por menos de uma hora por dia. Por quê essa orientação?

A Dra. Julieta Jerusalinsky, psicanalista em primeira infância e desenvolvimento infantil, autora do livro ‘Intoxicações eletrônicas o sujeito na era das relações‘, atribui aos três primeiros anos de vida da criança o sentido de  um “tempo primordial da constituição psíquica, fase que está em jogo a constituição de si, a apropriação do próprio corpo e a relação consigo mesmo, além do estabelecimento das relações com o outro”.  Assim  entende-se que para tornar-se humano, a criança depende do ambiente em que vive, dos estímulos que recebe e da interação e convívio com outros seres humanos.

Questionada sobre como criar filhos neste mundo de telas, a Dra. Jerusalinsky responde  que  “a infância é um tempo da vida crucial para a formação, mas ela termina. Por isso precisamos pensar em como arrumar tempo e lugar para transmitir à criança aquilo que achamos que é decisivo para que ela se torne o adulto de amanhã. Dá muito trabalho, é verdade. Mas ao conviver com uma criança acabamos inventando brincadeiras e evocando passagens da nossa própria infância que, se não fosse pela criança, cairiam no esquecimento. Assim elas acabam por nos fazer um favor aos nos tirar do automatismo da vida adulta e nos convidar a construir uma brincadeira entre gerações. Costuma ser surpreendente o que pode acontecer quando desligamos as telas e abrimos lugar para o convívio”

Em tempo de quarentena, como manter um equilíbrio saudável entre a vida online e offline?

Pais não precisam virar professores e nem entreter as crianças o tempo todo, mas precisam organizar uma rotina familiar, fazer combinados com as crianças e adolescentes, impor limites de horas de uso das telas, permitir o ócio, incentivar outras atividades e atuar como mediadores entre a vida real e virtual.

 

O QUE FAZER COM AS CRIANÇAS EM CASA?

Organize o dia estabelecendo uma alternância entre períodos de expansão e contração, movimento e concentração, atividade e descanso. Essa oscilação pendular promoverá equilíbrio ao ambiente e harmonia nas relações familiares. Não se cobre demasiadamente tentando dar conta de tudo. Aprenda a observar as crianças. Elas dão muitas pistas de como agir com mais leveza e assertividade.

Lembre-se: crianças aprendem constantemente. Mesmo longe da escola elas não param de apreender o mundo e aprender.

COMO ESTIMULAR A CONEXÃO DA CRIANÇA COM A NATUREZA NO DIA A DIA

Este é um momento de fazer juntos,  compartilhar de forma lúdica as atividades do dia a dia: preparar as refeições, lavar a louça, arrumar a cama, regar as plantar, dar comida para os animais domésticos, etc. Tudo é aprendizagem, talvez até muito mais significativa e também capaz de trabalhar a autoestima da criança.

No caso das crianças menores, da Educação Infantil, sabemos que a aula online é muito mais desafiadora. Alguns especialistas recomendam manter as lembranças da escola de forma “analógica” – recordando histórias, brincadeiras, canções aprendidas na escola, e revendo o portfólio das crianças do ano anterior.

Outras ideias cabem também aqui, tais como: troca de correspondências entre as famílias, troca de livros com desenhos feitos pelas crianças sobre a história, troca de brinquedos, e a confecção de um álbum de fotos dos amiguinhos da sala.

Considerações e cuidados importantes:

  1. Se as crianças já estão em frente às telas para as aulas online, o que elas podem fazer  offline no seu tempo livre?
  2. Se os dispositivos digitais tornaram-se meios de educação, socialização e entretenimento, quais os limites para a exposição das crianças as telas?
  3. Conheça o conteúdo que as crianças estão acessando. Por trás dos Youtubers e Influencers que as crianças e adolescentes estão seguindo existe um forte apelo mercadológico e consumista.
  4. Cuidado com o efeito viciante dos vídeos games e séries.
  5. Incentive outras atividades que possam ser prazerosas, em que as crianças possam expressar sua subjetividade em relação ao que estão vivendo: desenho, colagem, trabalhos manuais, jardinagem, fotografia, música, etc,
  6. Desconectem-se  dos dispositivos digitais pelo menos 2 horas antes de ir para cama para preservar a qualidade do sono. Algumas pesquisas indicam que a luz emitida por tablets e celulares tiram o sono e podem fazer mal à saúde.
  7. Preserve o convívio familiar salutar longe das telas, com refeições feitas juntos, um jogo em família à noite e contação de histórias para os pequenos.

Não se esqueça, dada a frieza dos interações virtuais, o convívio familiar é a dimensão do real e do humano capaz de acolher e preencher a vida da criança.

 

Abraço caloroso e saúde

Ana Lúcia Machado