Brincar sem plástico é nosso desafio em julho, mês dedicado à redução do uso de materiais plásticos, em especial os descartáveis de uso único.
Você sabia que em julho acontece uma campanha global denominada “Julho sem plástico”? A campanha tem por objetivo diminuir o uso e o descarte de plástico no planeta. Esse movimento começou em 2011 com a Ong australiana Plastic Free Foundation pedindo para as pessoas, durante o mês de julho, evitarem o uso de plásticos descartáveis, de uso único ou de curto prazo. O sucesso da iniciativa ganhou adeptos por todo o mundo.
Pegando carona neste movimento, Educando Tudo Muda propõe a reflexão sobre a presença do plástico no brincar da criança, e o desafio do brincar sem plástico, sugerindo algumas ações para diminuir a quantidade de brinquedos plásticos visando a redução da produção e consumo desse material e incentivando o brincar livre na e com a natureza.
Por que aderir ao movimento brincar sem plástico?
A poluição plástica é hoje uma das principais causas de agressão ao meio ambiente e à saúde dos seres viventes. Pesquisa recente do Instituto Alana, conduzida pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Química Verde, Sustentabilidade e Educação (GPQV), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), apresenta importantes dados que alertam sobre os brinquedos de plástico e seu impacto na saúde das crianças e do meio ambiente.
Muitos utensílios infantis de uso diário são feitos desse material: mamadeiras, chupetas, copos, pratos e principalmente brinquedos. Sabemos que 90% dos brinquedos fabricados no mundo são feitos de plástico e que nem todo tipo de plástico é adequado para a produção de brinquedos. Algumas substâncias utilizadas na fabricação desses produtos são potencialmente tóxicas, cancerígenas e causadoras de distúrbios hormonais nas crianças.
Outro agravante são aqueles brinquedos de origem duvidosa, de fácil aquisição e baixo custo, brinquedos comercializados ilegalmente, sem certificação do INMETRO. São brinquedos de baixíssima qualidade que quebram facilmente e logo são descartados indo parar no lixo em curto tempo.
Você sabe avaliar o que é um bom brinquedo para a criança?
Brinquedo precisa ser de plástico?
É preciso brinquedo para brincar?
Com quantos brinquedos se faz uma infância feliz?
Para não cometer excessos, cair em modismos ou subestimar a capacidade criativa das crianças, precisamos entender a relação das crianças com os brinquedos.
Quanto menos estruturado e cheio de detalhes for o brinquedo, mais ele exigirá da criança e permitirá o uso da imaginação e criatividade. Quanto mais simples ele for, maior a liberdade da criança em transforma-lo em outras coisas de acordo com o enredo das suas brincadeiras.
Sob o ponto de vista da imaginação e criatividade infantil, os brinquedos industrializados feitos de materiais sintéticos, criam uma situação de passividade na criança, provocam um certo “empreguiçamento” e empobrecimento da vida interior. Uma vez que esses brinquedos são desenvolvidos com funcionalidades específicas, entregam nas mãos da criança um produto rígido, limitando a atuação infantil, e na maioria das vezes fazendo dela mera expectadora ou executora.
Em termos de estímulos sensoriais, o plástico é um material extremamente limitado e pobre para o desenvolvimento infantil – sem cheiro; é frio e liso ao tato; é leve, possui tamanho desproporcional ao peso; de cor forte e antinatural.
Na concepção do artista plástico e teólogo Gandhy Piorski, autor do livro Brinquedos do Chão, “o plástico é um imitador de realidades que induz a criança a falsas sensações distanciando-a dos processos de aprendizagens do mundo vivo”.
Susan Linn, psicóloga norte-americana, autora do livro ‘Crianças do consumo: a infância roubada’, afirma que “uma boa brincadeira é 90% a criança e 10% brinquedo”. Os brinquedos industrializados, os brinquedos prontos, fazem exatamente o inverso: sobrepõem-se a potência da criança e ao seu protagonismo.
Indo ainda mais fundo nesta questão, a escritora britânica Jay Griffiths, em seu livro “Kith – the riddle of the Childscape”, afirma que “as crianças que brincam apenas com brinquedos industrializados têm um oco interior que não pode ser suprimido pelo seu próprio brincar e por sua imaginação, criando uma relação de dependência da indústria do entretenimento para sua satisfação constante.”
NATUREZA, O MAIOR E MELHOR PARQUE DE DIVERSÕES E BRINQUEDOS
Os ambientes naturais, ricos em áreas verdes, são fonte de um brincar criativo. Sabemos o quanto o brincar é fundamental para o desenvolvimento infantil e a saúde da criança. Entretanto é preciso ressaltar que a potência da atividade lúdica se encontra na própria criança e não apenas nos brinquedos.
É necessário oferecer a criança tempo e espaços que favoreçam o brincar. E não existe lugar mais positivo para isso do que a natureza, o melhor brinquedo. Nela encontramos os estímulos mais ricos e completos para o desenvolvimento integral da criança.
Brincar em espaços naturais coloca a criança diante do potencial lúdico da natureza e expõe os pequenos à riqueza e diversidade dos elementos naturais, propiciando infinitas possibilidades de brincadeiras e invenção dos próprios brinquedos com o que a natureza oferece – gravetos, sementes, folhas, etc. Brincando com a natureza a criança explora um campo fértil para o exercício da criatividade. As materialidades telúricas são provocadoras, nutrem a imaginação criadora e a vida anímica da criança.
Um passeio na mata, uma caminhada no parque, praça ou jardim, num lugar bonito com pássaros, árvores, plantas, flores, terra úmida e insetos, aguça a curiosidade infantil. Cheiros novos, sons de pássaros, do vento, das folhas secas. Formas diferentes de folhas, cores variadas de flores. Observar formigas, lagartas, minhocas, musgos, líquens, diversos seres vivos fascinantes para a essência curiosa e exploratória da criança.
Andar na lama, na chuva. Acompanhar borboletas, subir em árvores, correr entre elas ou se esconder, colher frutos, pegar pedras. Construir brinquedos e composições artísticas com objetos da natureza, dar asas à imaginação. Tudo isso são possibilidades encantadoras dos brinquedos oferecidos pela terra. De forma que ao término da brincadeira, em uma autêntica logística reversa, tudo pode retornar para a natureza decompondo se, e gerando mais vida.
Podemos fazer escolhas simples em prol da saúde da criança, mas para isso é necessário atitudes firmes frente aos apelos de consumo da publicidade das empresas fabricantes de brinquedos. Se estivermos convictos dos efeitos negativos deste excesso de plástico na vida da criança e das consequências para o meio ambiente, tenho certeza que será mais fácil dizer “não” para o próximo brinquedo de plástico.
A saúde da criança e do meio ambiente dependem da nossa reconexão com a natureza em todos os âmbitos da vida e da ética do cuidado a todos os seres viventes.
COMO MUDAR HÁBITOS E PROMOVER O BRINCAR SEM PLÁSTICO?
Brincar sem plástico – a mudança começa com pequenas atitudes e cada um de nós pode fazer a diferença. A conscientização sobre nossos atos e hábitos é o primeiro passo. Comece analisando a quantidade de brinquedos de plástico que você tem em casa. Essa análise também é válida para as escolas, principalmente as escolas de Educação Infantil.
Algumas atitudes podem contribuir para as mudanças que queremos ver no mundo: o incentivo ao brincar livre na natureza, a aquisição de brinquedos feitos de outros materiais, a redução do consumismo de brinquedos plásticos, o aumento da vida útil dos brinquedos de plástico que as crianças já possuem por meio do incentivo a práticas de trocas, empréstimos e doação de brinquedos, a adoção de brinquedos coletivos, etc. Veja algumas sugestões:
1.Promova o brincar livre na natureza – no quintal de casa, jardim, praças ou parques públicos
2.Incentive as crianças na criação de seus próprios brinquedos, como faziam nossos antepassados, utilizando elementos naturais: gravetos, sementes, folhas, pedras. Vale também papelões, rolhas, tecidos, revistas e jornais – reutilize esses materiais
3.Opte por outros materiais ao adquirir brinquedos novos para as crianças, como os brinquedos artesanais, educativos – brinquedos de madeira de reflorestamento, de feltros, bonecas de pano, etc
4.Reduza os brinquedos plásticos deixando disponíveis apenas aqueles com os quais a criança brinca com maior frequência, os seus favoritos
5.Dê um novo destino aos brinquedos mais velhos ou aqueles com os quais a criança não brinca mais, doando-os para instituições. Isso prolongará a vida útil do brinquedo, evitando o descarte
6.Faça os brinquedos circularem entre as crianças organizando feiras de trocas
7.Incentive o empréstimo de brinquedos entre amigos da escola, vizinhança e familiares
8.Adote a prática do brinquedo coletivo entre irmãos e primos, valorizando o acesso em detrimento da posse
9.Leve os brinquedos quebrados aos hospitais de brinquedos para serem recuperados ou doe para serem customizados
10.Descarte adequadamente os brinquedos que não têm mais conserto e/ou cobre dos fabricantes a logística reversa
11.Converse com sua família e amigos sobre o movimento brincar sem plástico e comunique a sua decisão de reduzir o uso de brinquedos de plástico para obter apoio
12.Compartilhe em suas redes sociais fotos, vídeos de dicas de brinquedos feitos de outros materiais, e das crianças brincando na e com a natureza usando #brincarsemplastico para atrair mais adeptos
Brincar sem plástico – esse é sem dúvida um grande desafio para as famílias e para as escolas. Sabemos que não eliminaremos o plástico de nossas vidas totalmente, mas podemos refletir sobre seu uso, nossas escolhas e o consumo de maneira ética. Precisamos nos unir por um mundo com menos resíduos, em prol da saúde da criança e do planeta. Adote o #brincarsemplastico em sua casa e em sua escola, e incentive o brincar na e com a natureza.
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Abraço afetuoso e saúde
Ana Lúcia Machado