Educação é arte.
“A pedagogia não pode ser uma ciência – deve ser uma arte” - Rudolf Steiner
A crise atual do sistema educacional brasileiro requer reflexão, revisões e a busca por novos paradigmas para a educação.
Propõe-se aqui um aprofundamento e compreensão da extensão dessa crise a partir da análise de algumas premissas, sendo que as duas primeiras foram apresentadas em artigos anteriores.
- Visão do ser humano integral (acesse aqui)
- Origem da palavra Educar (acesse aqui)
- Autoconhecimento e Autoeducação
Passamos agora a abordar a necessidade do trabalho apurado de autoconhecimento e autoeducação por aqueles que se dispõem ao exercício da docência.
Para a compreensão da relevância da autoeducação, analisemos o pensamento de Rudolf Steiner, filósofo e educador austríaco (1861-1925):
Não há, basicamente, em nenhum nível, uma outra educação que não seja a auto-educação. […] Toda educação é autoeducação e nós, como professores e educadores, somos, em realidade, apenas o entorno da criança educando-se a si própria. Devemos criar o mais propício ambiente para que a criança eduque-se junto a nós, da maneira como ela precisa educar-se por meio de seu destino interior.
Podemos entender ‘destino interior’ como a essência central distinta, individual do ser humano.
Paulo Freire também fala que é necessário se educar para educar, e que se educar é impregnar de sentido cada momento da vida, cada ato do cotidiano.
Portanto, eu educo o outro, educando a mim mesmo, e o que faço enquanto educador, é criar o ambiente favorável em volta da criança, proporcionando assim condições por meio das quais a própria criança se revele.
Como um jardineiro, nossa tarefa é encontrar as condições adequadas para cada tipo de semente, o tipo certo de solo, o adubo adequado, a proteção e irrigação corretas, achar os ingredientes apropriados que darão suporte e força a semente, para que ela brote, surja para fora, emerja sua natureza e cresça formosa.
Levando em conta que uma das características marcantes da criança é sua capacidade imitativa, podemos ressaltar a importância de modelos adequados de homens e mulheres em torno da criança como espelhamento de seres humanos íntegros. A criança não repete apenas a fala, o movimento e gestual do adulto, ela é capaz de assimilar o que o educador é, e assim reproduzir sua maneira de viver. E mais tarde, quando adolescente, de forma contumaz, procurará a veracidade nos educadores, tutores e pais, por meio da comparação entre o que esses falam e suas ações, seu jeito de se colocar no mundo, de ser e viver.
Por esta razão o educador, como referencial para a criança, adolescente e jovem, tem grande responsabilidade, pois atua no campo ético moral. Daí a importância do seu trabalho constante de autoconhecimento, como instrumento de revisão, aprimoramento e desenvolvimento humano, como processo de construção de si mesmo, num contínuo explorar-se, conhecer-se, transformar-se.
Enquanto educadores, precisamos nos tornar modelos mais adequados para as novas gerações que iniciam seus processos de construção de seres humanos no mundo.
A ARTE COMO CAMINHO DE REENCANTAMENTO DA EDUCAÇÃO
A educação convencional que vem se perpetuando, está fundamentada numa concepção materialista, cientificista, mecanicista, pautada na transmissão de conhecimento e informação. Vem privilegiando o desenvolvimento do lado cognitivo, deixando em segundo plano o corpo e a alma da criança. Isto porque o homem moderno tem endeusado a abstração, a fórmula, a quantificação e os avanços tecnológicos.
A partir da concepção do ser humano integral, não podemos mais fundamentar o sistema educacional levando em conta apenas uma parte do que é o homem. Precisamos educar na/para inteireza.
Precisamos educar para a vida, abarcar o coração do homem no processo educativo, considerando seus sentimentos, emoções, relações. É necessário trazer para a educação temas essenciais, como o amor, a alegria, solidariedade, gentileza, temas estes que a racionalidade moderna não comporta por não conseguir explica-los cientificamente.
Precisamos reencantar a educação, com uma linguagem que fale à alma da criança, por meio de vivências artísticas, estéticas. A arte é o caminho que permite o desenvolvimento harmônico da criança, porque é a linguagem do coração. Ela permeia a razão e a conecta com o lado anímico da criança, fortalecendo a sua vontade, o seu fazer no mundo, e suas interações com o mundo.
A expressão artística, seja pela pintura, modelagem, dança, teatro, poesia, música, etc., desperta a consciência do mundo interior de cada ser, faz a ponte entre o lado intelectual humano e sua capacidade de ação, possibilita a criação de algo resultante da sua imaginação e fantasia.
Rudolf Steiner afirma que: “A pedagogia não pode ser uma ciência – deve ser uma arte”. Educação é arte. Que possamos nos sentir inspirados para fazer uma nova escola, fundamentada no respeito à totalidade do ser humano, na confiança do desenvolvimento e aprimoramento das potencialidades humanas.
Como síntese desta reflexão, fica aqui a poesia do Profº Ruy Cezar do Espírito Santo:
A Grande Transformação
Buscar a fonte da inspiração artística
É dirigir-se ao mais dentro do Homem
À Fonte única que de forma original
Derrama o fruto da sua percepção
Encontrar essa Fonte
É desvelar a possibilidade do Amor
É trazer o Homem novamente aos dez anos,
De onde se afastou pelo que chamamos de “educação”…
O Amor dissipou-se no instante em que o “jovem de 10 anos”
Sentiu-se perdido nos labirintos escolares,
Onde cabeças sem coração são “formadas”
Sem a presença da Arte…
Assim, resgatar a Arte
É redescobri a Fonte interior de Alegria e Amor…
É voltar aos dez anos, desta vez
Ciente do sentido e da significação da existência.
O texto original e completo deste artigo está publicado na Revista Interespe, nº 8 – jun 2017, da PUC de São Paulo e disponível pelo link:
http://www.pucsp.br/interespe/revistas/downloads/revista-8-interespe-jun-2017.pdf
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Abraço carinhoso
Ana Lúcia Machado