
Estamos diante de uma crise do sistema educacional no país. Sabia que um a cada quatro alunos que inicia o ensino fundamental no Brasil, abandona a escola antes de completar a última série e que o desinteresse do jovem pelos estudos é apontado como uma das causas da evasão escolar?
Estamos diante de uma crise do sistema educacional no país, que nos conduz a um momento de grandes revisões e busca por novos paradigmas para a educação. O modelo vigente não atende as reais necessidades da sociedade, um modelo que reduz o aluno a um simples futuro candidato a uma vaga no mercado de trabalho cada vez mais competitivo.
Um a cada quatro alunos que inicia o ensino fundamental no Brasil, abandona a escola antes de completar a última série – dado do Relatório de Desenvolvimento 2012, divulgado pelo Pnud – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
O Brasil tem a terceira maior taxa de abandono escolar entre os 100 países com maior IDH – Índice de Desenvolvimento Humano . Na América Latina, só a Guatemala e Nicarágua tem taxas de evasão superiores.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , 1,3 milhão de jovens entre 15 e 17 anos, deixaram a escola sem concluir os estudos, dos quais 52% não concluíram sequer o ensino fundamental. Dentre as causas da evasão, o desinteresse do jovem pelos estudos é apontado como um dos fatores no âmbito escolar.
Mais do que quantificar a extensão dessa crise, precisamos compreender sua profundidade e para isso partimos da análise de três premissas:
- Visão do ser humano integral
- Origem da palavra Educar
- Autoconhecimento e Autoeducação
A primeira parte deste artigo apresentará e discutirá a visão do ser humano integral.
Para compor esta integralidade propomos a observação do desenho do Homem Vitruviano de Leonardo Da Vinci, datado de 1490.
A que nos remete esta imagem?
– Completude
– Harmonia
– Equilíbrio
– Beleza
A representação das proporções ideias do ser humano no desenho de Leonardo da Vinci, traz a ideia de equilíbrio e harmonia entre as partes que compõe o homem, sem privilegiar nenhum aspecto em detrimento do outro.
Dando um salto na História da Arte, comparamos a obra de Leonardo da Vinci a de Tarsila do Amaral , com o quadro Abaporu, de 1928.
A figura humana na obra de Tarsila do Amaral retrata o homem da terra, ligado à natureza. Trata-se do homem do fazer, que caminha, planta, colhe, usa a força física de seus membros superiores e inferiores, e por esta razão apresenta-os bem desenvolvidos. Podemos definir o homem de Tarsila como o homem do fazer, da ação.
Na comparação com o Homem Vitruviano, pode-se perceber a perda das proporções ideais do ser humano.
Contrapondo o homem do fazer de Tarsila do Amaral, na pintura a seguir, de autoria desconhecida, observamos a desproporcionalidade entre cabeça e corpo.
Pela ênfase dada à cabeça, evidencia-se a importância da racionalidade, do intelecto, do desenvolvimento cognitivo expressa pelo artista. Temos aqui o homem que dá prioridade a sua capacidade pensante.
Este é o homem contemporâneo, que tem na racionalidade sua prioridade e a utiliza como o grande condutor de sua vida.
Formulamos então a pergunta: se no passado o homem desenvolveu seus membros inferiores e superiores privilegiando a capacidade do fazer e hoje ele prioriza o desenvolvimento cognitivo, representado pela cabeça, como fica o desenvolvimento da região toráxica, composta pelo coração e pulmão, que forma seu sistema rítmico?
A visão ampliada do ser humano, proposta pela Antroposofia, concebida pelo filósofo e educador Rudolf Steiner, 1861-1925, considera a espiritualidade parte da constituição do ser humano, assim como também aponta o corpo astral, um corpo de emoções.
Fomos até aqui guiados por uma visão fragmentada do ser humano, precisamos reconstruir sua visão integral como ponto de partida para a Educação, conforme diz o Profº Ruy Cezar do Espírito Santo em O renascimento do Sagrado na Educação: “a inserção da espiritualidade no contexto educacional é essencial”. E para que isso aconteça, o primeiro passo é compreender a totalidade da constituição humana.
O reconhecimento da dimensão espiritual do ser humano, coloca nos diante de grandes desafios como educadores. Considerando as palavras de Huberto Rohden, filósofo educador catarinense (1893-1981) em Novos Rumos para a Educação:
“Todo homem é muito mais aquilo que é potencialmente do que aquilo que é atualmente […] Uma semente é potencialmente a planta que dela vai brotar, embora não seja ainda atualmente essa planta. A verdadeira natureza de uma semente de palmeira é a palmeira que dela nascerá. A ‘natura’ é a coisa ‘na(sci)tura’, isto é, aquela coisa que vai nascer. A potencialidade é, pois, a íntima natureza de um ser, a sua verdadeira natura ou natureza”
Pode-se afirmar que como educadores trabalhamos com aquilo que ainda não é visível no educando externamente, e devemos atuar como facilitadores na tarefa de tornar manifesto aquilo que ele carrega dentro de si, sua essência central; objetivar, sua subjetividade.
Como o educador pode estabelecer uma relação com a verdadeira essência do ser ainda não manifesta de modo a facilitar sua exteriorização, e não permitir que a temporalidade das atitudes desarmoniosas externas, interfira negativamente no processo educativo?
Rohden nos instiga ao afirmar que:
“Toda a verdadeira educação consiste em que o homem faça a sua existência à imagem e semelhança da sua essência; que essencialize a sua existência; que verticalize as suas horizontalidades; que divinize a sua humanidade; que faça o seu externo agir tão bom como é o seu interno ser”
Reconhecer a essência central do ser humano, invisível externamente, bem como recompor as partes para a visão de sua totalidade, como visto até aqui, é tarefa fundamental para repensar-se novos rumos na educação.
No próximo artigo será analisada a segunda premissa proposta: origem da palavra Educar.
O texto original e completo deste artigo está publicado na Revista Interespe, nº 8 – jun 2017 página 49, da PUC de São Paulo e disponível pelo link:
http://www.pucsp.br/interespe/revistas/downloads/revista-8-interespe-jun-2017.pdf
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Abraço carinhoso
Ana Lúcia Machado